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Mauricio-Perdição
#462066 A glândula não passa do tamanho de uma noz, mas é a grande assombração da vida do homem.

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A biópsia foi feita no início de julho do ano passado. Com os resultados em mãos, o representante comercial Eduardo*, 65 anos, relutou, em meio a uma miríade de sentimentos que batiam na ansiedade e rebatiam em incertezas. Mas não resistiu. “Li, mas os termos técnicos deixam você em dúvida quanto ao que foi diagnosticado”, reconhece. “Mas um termo se destacava, algo relativo a carcinoma; foi aí que pensei que talvez as coisas não estivessem tão favoráveis.” Na mesma semana, o médico confirmou: Eduardo tinha câncer de próstata.


Simples assim, sem sintomas aparentes. No caso do representante comercial, a descoberta (e a salvação) vieram graças aos 15 anos de exames preventivos regulares. Em 2009, o índice do exame PSA indicou 4,5 ng/ml, contra 3,5 ng/ml do ano anterior. O índice tido como normal varia bastante, mas geralmente um aumento na contagem indica anormalidades. Quando os níveis chegaram a 5,7 ng/ml, em 2010, o urologista solicitou uma biópsia e um exame de toque retal para Eduardo. Diagnóstico feito.


“A doença não se tornou uma dor de cabeça, não me impediu de conseguir dormir”, garante. “Minha família, aliás, ficou mais preocupada comigo do que eu mesmo.” Tudo bem. Mas, quando o médico indicou a cirurgia como tratamento, o representante tentou (como talvez a maioria de nós faria) pular fora. Fez perguntas, pediu por outras opções, cogitou adiamentos… A ideia não era chegar à luz no fim do túnel, mas trazer a luz para o meio do percurso. Em vão. Os três médicos consultados foram categóricos: adiar a cirurgia era possível, mas adiar o inevitável, não. Biópsias de controle deveriam ser feitas periodicamente, o câncer poderia aumentar, se espalhar… “E, aos 65 anos, eu poderia apresentar outros problemas de saúde que inviabilizassem a operação.”

Em agosto, Eduardo foi submetido a uma prostatectomia radical – a retirada completa da glândula.

A próstata em detalhes


Pouco maior do que uma noz, com não mais do que 20 gramas, localizada próximo à bexiga e anterior ao reto, a próstata trabalha discretamente. Seu papel mais importante é no momento da reprodução. Os espermatozoides partem dos testículos, passam pelas vesículas seminais – onde recebem um banho de frutose, vitamina C e prostaglandina – e chegam à próstata. A glândula adiciona enzimas, ácido cítrico e zinco à mistura, que se transforma no seu esperma.


Mas, passado o auge da fase reprodutiva, a partir dos 40 anos a próstata passa a ficar meio sem função – e aí pode começar a apresentar problemas. Ao lado do câncer, os mais comuns são a prostatite e a hiperplasia benigna: a primeira é uma inflamação (às vezes causada por bactérias), facilmente tratável; a segunda, um aumento anormal da glândula, que, apesar de benigno, comprime a uretra e provoca dificuldades de micção e sobrecargas na bexiga. O câncer, em compensação, tem riscos de sobra.


Trata-se, de acordo com dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA), do segundo tumor mais comum entre os homens brasileiros, atrás apenas do de pele – responde por 22,1% dos casos (contra 22,7% dos de pele), com uma estimativa de mais de 50 mil novos casos por ano. “A verdade é que, se todos os homens vivessem até os 100 anos, 100% deles teriam a doença”, afirma o urologista Stênio Zequi, do Hospital A.C. Camargo, especializado em casos de câncer, em São Paulo. “A partir dos 50 anos, o risco de desenvolver o mal cresce continuamente e, a partir dos 80 anos, mais da metade da população pode apresentá-lo.”


Além do envelhecimento, o histórico familiar e a raça são fatores determinantes para o aparecimento do câncer – negros desenvolvem tumores com mais frequência e agressividade. Quando dissemos que o diagnóstico precoce salvou Eduardo não foi à toa: se o câncer já tiver saído da próstata e se espalhado para os ossos e órgãos próximos, a chance de sobreviver mais do que cinco anos é de apenas 30%; se for percebido antes disso, o número pode aumentar para 100%.

A luz no horizonte


Nem tudo, porém, é tão obscuro. As notícias envolvendo o câncer de próstata indicam que as mortes vêm diminuindo consideravelmente. “Hoje, a cura é regra entre 80% e 90% dos casos, com sobrevida similar à população de mesma idade sem câncer”, atesta Zequi. As estatísticas explicam: 94% dos diagnósticos são de tumores malignos em estágio I ou II – no III o câncer começa a se espalhar, e nos IV e V já invadiu tecidos vizinhos e ossos.


O declínio da mortalidade e a descoberta nos estágios iniciais têm sido atribuídos àquilo que foi a salvação também no caso que ilustra esta reportagem: o uso disseminado do exame de PSA. A substância medida pelo teste, o antígeno prostático específico, é produzida pela próstata para liquefazer o sêmen. Com a glândula saudável, o PSA circula apenas dentro dela; se há problemas com o tecido glandular, o PSA “transborda” e cai na corrente sanguínea. Quando o câncer está estabelecido, por exemplo, o nível atinge números altíssimos, mas a menor variação indica uma alteração – por isso mesmo a avaliação é muito detalhada e feita em nanogramas (um bilionésimo de grama) por mililitro de sangue.


O senso comum sempre apontou que o normal seria, para um homem sadio, um índice de até 4 ng/ml. Mas o câncer pode aparecer mesmo quando a contagem está abaixo disso. Um estudo realizado nos EUA como parte do Ensaio Sobre a Prevenção do Câncer de Próstata acompanhou 2 950 homens ao longo de sete anos; em nenhum deles o nível de PSA passou de 4 ng/ml – mas 15% desenvolveram câncer. Outra pesquisa, da Escola de Medicina Johns Hopkins (EUA), concluiu que a velocidade com que os níveis de PSA eventualmente crescem pode ser um marcador mais confiável do que o próprio crescimento. Eis o motivo da importância do acompanhamento médico frequente.


Preconceito x Sobrevivência


Só que esse teste sozinho (ainda) não é suficiente para o diagnóstico preciso de um câncer – a hiperplasia também altera a contagem do PSA, por exemplo, e só em 20% dos casos é possível detectar o mal por meio dessa forma isoladamente. Por isso os médicos ainda lançam mão, com o perdão do trocadilho, do exame de toque e da biópsia, como foi o caso de Eduardo. “A dosagem do PSA e as avaliações periódicas, com exame de toque, contribuem para o diagnóstico em fase precoce”, assegura o oncologista Volney Lima, da clínica Oncomed, em Belo Horizonte (MG). “Mas muitos pacientes relutam em realizar tais exames – embora eles não afetem a função sexual ou a virilidade.”


Nem é preciso recorrer a profissionais para encontrar quem ateste esse preconceito. O administrador de empresas José Tucci viu o avô, o pai e alguns tios lutarem contra o câncer de próstata. Ainda assim, ele nunca deu bola para o fator hereditariedade. Só aos 50 anos começou a fazer exames – restritos à dosagem do PSA. “O preconceito faz com que tenhamos receio de consultar o médico, só pelo desconforto do procedimento”, reconhece.


Depois de descobrir um câncer – como no caso de Eduardo, graças a uma suspeita a partir da contagem de PSA -, José superou a fase retrógrada e machista. “Já orientei meus três filhos a fazer o acompanhamento – e a não dar ouvidos para piadinhas”, diz. “Não adiantam só ultrassom, exame de sangue; o médico tem de constatar, e a sensibilidade dele é mais importante do que qualquer teste de laboratório.”


Poucos meses depois do diagnóstico, José teve a próstata retirada – e em três dias estava em casa. A prostatectomia, feita por videolaparoscopia ou por cirurgia aberta, é um dos tratamentos possíveis. Além dela, os mais consagrados são a radioterapia, a braquiterapia (radioterapia na qual são colocadas sementes de radiação na próstata), a hormonioterapia e a quimioterapia – estas duas indicadas para metástase. Na hormonioterapia, drogas específicas inibem a captação de testosterona nas células, ou interrompem a produção do hormônio – que, de certa forma, abastece a doença. Aí, o tumor não regride, mas deixa de avançar e fica estacionado. “O tratamento é eficiente e dura por tempo indeterminado, até o paciente deixar de responder a ele”, diz Celso Gromatzky, consultor de urologia da MH. “Mas, sem testosterona, há um efeito colateral especialmente chato: é como se o sujeito entrasse em uma espécie de andropausa.”


O tipo de tratamento varia – apesar de, sempre que possível, os médicos indicarem a remoção da glândula. O certo é que todos trazem uma ou outra complicação; e que o cenário hoje, em compensação, é animador (avanços na área também são fatores que reduziram o risco de morte). O perigo de alguém que tenha sido submetido a uma prostatectomia sofrer de incontinência urinária era de 30% há 20 anos; hoje, chega a 5%. O de impotência, que era de 80%, não passa mais de 30%.


A remoção da próstata pode acabar com a ejaculação, já que a cirurgia remove as vesículas seminais (o orgasmo é mantido). Rádio e braquiterapia têm efeitos parecidos. E, na hormonioterapia, aparecem alterações de libido e função sexual, ganho de peso e males metabólicos.

Reaprendizado


Os médicos sabem que, mais do que na descoberta da doença e no tratamento em si, é no pós-operatório que os pacientes sentem de verdade os efeitos de tudo – principalmente os que veem virilidade como sinônimo de masculinidade. “O câncer envolve uma série de emoções, como sensação de vulnerabilidade, redução da autoestima, receios de incapacidade sexual…”, lista Stênio Zequi, do Hospital A.C. Camargo. São os chamados transtornos de ajustamento, quando o paciente aprende a conviver com o problema. “Felizmente a maioria se enche de coragem e enfrenta a doença”, diz o urologista.


É um pouco o caso do representante comercial Eduardo, que diz se dedicar a um novo aprendizado sexual. Cinco meses depois da cirurgia, a ereção ainda não é satisfatória, apesar de ser bem melhor do que no pós-operatório, quando nada acontecia. “Não ejaculo mais, e vou ter de me acostumar com isso, mas antes tenho de me acostumar com a ereção”, ele afirma. “Claro que não vai ficar igualzinho ao que era antes, mas isso não vai me fazer deixar de ser homem; eu tinha uma atividade sexual normal, e pretendo voltar a ter.”

O administrador José Tucci adota a mesma postura. “Desde quando o médico disse que eu tinha um tumor eu não entrei em pânico, não pensei que ia morrer. Sempre encarei de forma positiva”, garante. Hoje, mesmo com as dificuldades – “ninguém fala nada, mas você sai do hospital usando fralda” -, o espírito continua igual.


Os especialistas dizem isso mesmo. O câncer de próstata não é uma doença insidiosa – os riscos de morrer com ela são maiores do que morrer dela. “É necessário um trabalho para recuperar a sensibilidade, o controle sobre a pélvis, o controle sobre o próprio corpo”, diz José, que, sem mistérios, segue em frente. “O câncer é uma etapa que passou. Tenho meus planos, muito o que trabalhar. Não deixo de fazer absolutamente nada, e quero continuar assim.”

*Nome trocado a pedido do entrevistado.

Fatores de peso Saiba se você está no maior grupo de risco da doença

Os especialistas estimam que fatores ambientais – leia-se vilões como sedentarismo, dieta rica em gorduras animais e estresse – respondam por 90% dos casos de desenvolvimento de câncer de próstata. Outros 10% aparecem relacionados à herança genética: o risco de ter um tumor dobra se um homem teve um parente de primeiro grau com a doença (e se multiplica por seis se forem dois parentes). Por isso, quem tem histórico familiar deve passar por avaliações anuais de toque retal e PSA a partir dos 40 anos; os demais, a partir dos 50.

Para Mais cuidados sugiro que leiam o tópico:Sete maneiras de blindar sua próstota;
sete-maneiras-de-blindar-sua-prostata-t43016.html

amor;
-Wolf